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Deserto - Um Estranho Consultório

Por Eduardo Feldberg - 28/03/2011

Há algum tempo, ouvi de um cantor que “o deserto é a escola do Senhor”. Puxa, Amigo Fiel... Suas aulas podiam muito bem ser em gramados, como foi com Seus milhares de ouvintes, aos pés do Monte das Oliveiras, né?! Ensinamentos em pastos verdejantes, com paisagens naturais, árvores e flores vivas, ao som de Sua voz, mas parece que o Senhor tem certo interesse em eventualmente nos ver no deserto, não é? Talvez porque tens uma visão atemporal e ilimitada das coisas, enquanto eu, mero mortal, só consigo ver meu hoje, cercado de sarças, serpentes, arbustos e areia, muita areia. Tu podes ver o céu azul e estrelado que me espera logo ali, acima destas densas e sufocantes nuvens de poeira que obscurecem minha visão.

 

Já aprendi que os desertos e tempestades da vida são inevitáveis, afinal, a casa firmada na Rocha não cai, mas se molha tanto quanto as outras, e já compreendi que deveras, são nesses lugares que mais aprendemos, adquirimos experiências e percebemos nossa pequenez, contrastada com Sua grandeza. Nossa inferioridade, comparada à sua superioridade, nossas falhas e fraquezas, reveladas ante Sua perfeição e onipotência. Nossa ignorância, patenteada diante de Sua sabedoria. O descobrimento de nosso desconhecimento encoberto, comparado a Sua eterna onisciência. Como és Grande! Como és superior! E sei que o Senhor não faz questão de revelar isso para nos humilhar, mas sim para nos mostrar que temos em quem confiar! Que temos um Refúgio para nos abrigar. Um oásis em meio ao deserto.

 

No deserto, vejo como és misericordioso. Percebo como a ausência de Tua voz é extremamente desesperadora para minha vida. Como dependo de Ti, e não há subterfúgios. Como odeio com todas as forças do meu ser não conseguir Te ver! Como me angustio por não poder contemplar Tua face. Como preciso de Tua luz para alumiar minhas trevas. Como verdadeiramente sou pó, e de fato, não posso fazer nada sem Ti. Coisas meio imperceptíveis quando tudo está bem. Mas Seu aprendizado e Suas aulas doem! Como doem! Como um ser menor que os anjos, formado do barro e composto por pó, sinto dores no corpo, na alma, no espírito, na mente, no coração, no físico. Tenho tremedeiras, angústias, desesperos, ansiedades. O moldar do vaso dói demais, mas o aperfeiçoamento é assim, não é mesmo, Pai?! O açacalar das flechas exige raspões. O alisamento do vaso exige lixas. O embelezamento das paredes requer espátulas. Minha cura necessita de Suas mãos, que fazem feridas, mas as ligam! E no tratamento, descubro novas fraquezas, debilidades até então ocultas, mas que no decorrer do processo também serão tratadas.

 

Me ajude a não abandonar o processo, Amigo. Não me deixe esquecer que há bálsamo em Gileade. Lembra-me que há cura somente em Ti, impedindo-me de recorrer a outros fúteis meios de melhoria, placebos, impressões efêmeras e psicológicas, analgésicos paliativos que agradam, mas não curam. Já que estou aqui, faça valer, Amigo! Já que estou na chama, purifica-me. Já que estou na tempestade, lava-me! Já que estou no calor do deserto, esvazia-me de toda água impura em minha humilde e frágil composição, a fim de me encher com as águas da Fonte, indeterioráveis, ininfluenciáveis, puras como sua Origem, e totalmente satisfatórias e suficientes para meu tratamento.

 

Se devo passar por este treinamento, me ajude a manejar Sua Palavra, e lembrar-me de tudo aquilo que já li nela. Se devo passar pelo vale da sombra da morte, me faça olhar sempre para cima, para os montes, mesmo que arenosos, pois sei que é de lá que virá minha salvação. Se devo mesmo passar pelo deserto, que ao seu término eu saia cheio da Sua virtude, Espírito Santo, como fizestes com Cristo, mas pelo Teu amor, Oleiro Fiel, não me deixes sair sem minha cura! Que minha única marca ao findar deste processo seja a marca indelével de meu encontro contigO. Salva-me, e serei salvo. Cura-me, e serei curado! Eu ainda Te louvo!

 

Neste tempo de transformação, me ajude a olhar para Ti, a buscá-lO por aquilo que és. Não deixe que em meu coração, minha tristeza se avulte mais que o Seu trono. Que o sentimento de minha dor não seja maior que a convicção do Teu amor. Não permita que meu escopo esteja mais em alcançar Suas mãos que Sua face. Ajude-me a equilibrar isso, com certa pendência para Sua pessoa, Sua Glória, Sua presença. Não permita que impostores invadam meu coração, tentando tomar Sua proeminência, tampouco que minha sequiosa busca se dê em virtude destas “demais coisas”, que a seu devido tempo, indubitavelmente me serão acrescentadas.

 

Foque minha visão no Seu Reino. Parece impossível, afinal, como disse, só consigo ver arbustos, cadáveres, sequidão. Toque em meus olhos, Amado. Se com uma pequena brasa viva oriunda do Teu Santo Trono santificaste Teu profeta, o que não podes fazer com a ponta de Seus dedos?! Toque meus olhos, minha boca, meus ouvidos, minhas mãos, para tornar-me apto ao Seu serviço, vendo-O, falando contigO, ouvindo-O e sentindo-O, Senhor. Confesso que, à medida que escrevo, fico mais ansioso pelo meu estado final, que, à guisa de Jó, será muito mais admirável que meu status quo, e, tenho convicção de que não há maior status que o de ser igual a Ti, Cristo. É nesse molde que estou entrando, e esse deserto em que me encontro parece ter, de certo modo, a fôrma de Cristo, e creio que sairei dele um pouco (ou muito) mais parecido contigO. É, Amado... Eu realmente confio em Ti.

 

Não posso embelezar minha via crucis, mas me alegro em saber que ninguém pode enfear o fim dela! Vai valer a pena!

 

Que neste deserto em que peregrino, meu maior desejo não seja obter minha petição, assim como Jesus não priorizou um pedaço de pão, mas sim conhecer-Te, e prosseguir em Te conhecer. Que meus olhos estejam em Ti, e não em Canaã. Que eu veja Seu agir no percurso, e não apenas vislumbre as conquistas, olvidando-me de que estar ao Seu lado é o que mais importa. O deserto não é apenas a rota mais longa para minhas conquistas, mas o indispensável campo de treinamento e fortalecimento que adestrará minhas mãos para o melhor que está por vir.

 

Sinto que muitas vezes, o Senhor permite que eu reingresse no deserto para sentir novamente minha cabeça em Teu colo. Esse também é o meu desejo, mas peço-Te que, de alguma forma, instrua-me para que minha dor seja apenas um aditivo, e não o combustível de minha chama por Ti. Que ela não seja minha força motriz, mas apenas um acelerador, em Sua direção. Que não seja ela a me fazer caminhar para Ti, mas que apenas intensifique meus passos rumo à Tua Luz.

 

E, Espírito Santo, quando tudo isso acabar (e sei que vai), me ajude a não esmorecer quando as chamas se extinguirem, e a não me desligar quando a tempestade se acalmar. Ajuda-me a não baixar a guarda quando os inimigos rechaçarem, a não largar a espada quando os gigantes sucumbirem, nem ceder quando a fornalha se apagar. Não permita que eu me esqueça de Ti quando o deserto findar, nem que meus olhos se sequem em Tua presença, no término da dor. Não me deixe ser engodado pelo prazer do leite e do mel, amargos, se comparados à Tua presença e Tuas palavras. Não me deixe abandonar Seus braços, após ter sido neles carregado em meio ao dilúvio, nem me esquecer de Ti, meu precioso Médico, após a cura de minhas feridas.

 

O Senhor diz que na angústia, nascem irmãos. Vou confirmar isto por experiência própria! Tu me serás mais chegado que um.

 

Meu desejo? Que após este deserto, eu não Te conheça apenas de contigO andar, mas sim de me tornar um contigO!

 

Deserto... Que estranho consultório!

 

 

Por que te abates, oh minha alma, e te comoves, perdendo a calma? Não tenha medo, em Deus espera, porque bem cedo...

 

Jesus virá!

 

 

 

 

Eduardo Feldberg

www.eduardofeldberg.com.br

 

 

 

 

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